quinta-feira, 29 de abril de 2010

Indesejos lucrativos





E o terceiro que acaba de sair do quarto, encosta a porta e solta a ‘onça’ grunindo no bolso estéril da necessidade. Então, o chuveiro passa a lavar sua pele e nas gotículas aquáticas escorrem os resquícios do suor, contaminado pelo ‘indesejo’ da junção dos corpos nus.
Chega vistoso, o quarto e a ‘onça’, nessa hora, cede lugar à ‘garoupa’.
No quarto a máquina de fazer ‘felizes’ agora trabalha a todo vapor. Portanto... sudoríparas em ação.
O dia aparece e a fábrica, paradoxalmente, fecha a sua única porta; o seu regime é de turno... Noturno.
Seu único proletário é o seu próprio dono e nesse caso, havendo a Mais Valia, todos os lucros serão homônimos.
É nessa hora que seu corpo dorme e amanhece quando chega a tarde mandando à merda os homens e a vida.
Ela tem apenas 15 anos, e prazer mesmo...
Só sente quando come pizza portuguesa com refrigerante.


Jairo Cerqueira

domingo, 25 de abril de 2010

Terra do Sempre




Voaaaar e descobrir
Lado ‘alado’ –
 Que no espaço Azul
Existe um muito de possibilidades.
Percorrer toda dimensão celeste
E desfrutar da hermética realeza cósmica.
Por certo, uma aventura
Muito mais feliz que a do filho de Dédalo
Já que as asas da imaginação
Jamais cederão aos desafios solares.


Jairo Cerqueira

terça-feira, 20 de abril de 2010

DILETANTISMO



Compreendo a importância da cultura em nossas vidas. Mas, cá pra nós, em determinados momentos ela é tratada de maneira chata e maçante; às vezes até de forma irritantemente... aculturada. Por isso, é na ludicidade das bobagens irresponsavelmente dita que ela (a cultura), vez por outra, apresenta-se escamoteada.
É, por exemplo, no cinismo de ‘Luisão’ (dez anos mais velho que eu), com frases do tipo:
_ “É melhor o cara ser surdo a ter que ouvir certas bobagens”.
_ “Toda bunda num short jeans é bonita. Eu quero ver a beleza é numa saia de seda”.
Pode estar na ótica do meu sobrinho ‘Júnior’, que um dia me disse que Deus é o caminho, mas Edir Macedo é o pedágio.
Também na resposta de ‘Kiko Caetano (um professor que trabalha junto comigo) quando eu, ao ver o seu vizinho aparentemente debilitado, lhe perguntei:
_ Ele bebe?
_ Bebe pra desentalar, ele come é com farinha!!! – respondeu sem a mínima necessidade de reflexão sobre o questionamento.
Mas, minha real intenção é dedicar esse texto a ‘Chico’, que dispensa ser chamado por Heliogábalo (seu verdadeiro nome) pra evitar comparações com um Imperador Romano, sardanapalista libidinoso. Chico é um cidadão composto por um amontoado de adjetivos: ateu, etílico, aposentado, escravo da insulina e anarquista. Uma das pessoas mais interessantes que conheço – um guru. Com ele, as divergências, os conflitos e as convergências, quando postas em prática num balcão de bar conseguem superar muitos momentos que vivi um dia em lugares chamados de Banco Acadêmico.
Deus abençoe quem inventou a cerveja. Afinal, no domingo somos apenas bons atores quando estamos sóbrios.

Obs. A LIBER é só para disfarçar a propaganda etílica. rsrs

Jairo Cerqueira

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Ré volução





O aço brado
Assombra
No grito forte dado.

O brado que há sombra
Espanta, mente, aprisiona
E cala o bolso parco dos calados
Que emudecem quando cobrados.

Mas, que fazer com a maioria
Se historicamente sempre o maior_ria?

Assim:

Um furacão de ar sombrado e poluído
Cala-se, diante de apenas dez temidos
Sem ter a mínima noção de que “Mal assombrado”
Etimologicamente, também pode significar...
Carente de assombrações.


Jairo Cerqueira 

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Retinas aladas

Um vislumbramento de possibilidades
O deslumbramento de visões profundas
E o digladiar de cenas controversas
Proporcionam um eterno sonhar
Num transmutado “esperar” onírico
E os seus contrários reveladores

Mas com poeira nesses pára brisas
Os olhos tensos e astigmáticos
Percebem opacos todos os cenários.
Se come gato pensando ser lebre
O que não é quente sempre será frio
O que é possível passa a ser miragem.

Atravessando com os olhos sedentos
Povos marcados indo a passos lentos
Enxergam só o que está pela frente.
Com o pó da estrada em seus pára brisas
Seguem irrigando em lerdos camelos
Os desertos fúteis da malemolência.

Para os que pensam as coisas de outro modo
O calabouço da moralidade
Reserva um quarto em sua hospedaria.

Mas aprendendo a resistir ao chulo
O homem “livre” vai se libertando
Das romarias em Saaras fétidos.

Em marcha lenta seguem os beduínos
Sem vislumbrar esse sonhar futuro
Deixando as asas pros quase reféns.

Que mesmo assim, sem alçar vôos plenos
Vão sempre à frente dos que vão morrendo...
Curtindo a vida pelos seus atalhos.


Jairo Cerqueira       


segunda-feira, 12 de abril de 2010

Projestosterona



Quando o meu corpo encontra o seu,
Nossos glóbulos fervem de uma forma especial.
O suor da sua pele misturado com o meu
Denunciam a ebulição de uma mistura hormonal.

Nessa hora o que era dupla
Torna-se só unidade
É todo o imaginário
Brotando em realidade

Não pode o coração ser envolvido neste ato
Os dois corpos clamam apenas por prazer sexual
E muito bem entrelaçados, vão aos poucos se entregando.

Numa noite prazerosa, alucinante e enluarada
A volúpia bombardeia de uma forma exagerada
E os gemidos forjam a idéia de que os dois estão se amando.

Jairo Cerqueira (2006)


domingo, 11 de abril de 2010

BOCAS



Bocas que se enfrentam com trejeitos


Que se torcem, se contorcem, se apertam

Que se calam como se fosse o silêncio

O acúmulo de gritos imperfeitos.

Lábios que se xingam uns aos outros
Desrespeitando tristes regras sociais
Gritam, berram e cospem feito loucos...
No vomitório das palavras mais banais.

Nesta Ágora de discursos infundados
A platéia ia aos poucos percebendo
Que em meio a tudo aquilo havia desejo.

E confirmando o que pensavam os curiosos
Aquelas bocas sucumbiram à lei da carne
E o que era espúrio em pouco tempo virou beijo.



                                         Jairo Cerqueira


segunda-feira, 5 de abril de 2010

Particularidades da pobreza humana

Seu Renato vivia tranquilamente em sua casa  que apesar bonita, tinha uma janela velha e insegura. Mas isso não lhe incomodava. Pensava em comprar comida, livros, roupas e pagar as contas; a janela... pelo menos estava no lugar. Um dia sua casa foi saqueada e levaram muitos dos seus pertences. Seu Renato prestou queixa na delegacia e deitou falações na segurança, não a da sua casa, mas a do lugar onde morava. Mesmo criticando veementemente as policias, esperava reaver, através delas, é claro, os objetos furtados. Cansado de esperar, pois-se a criticar ainda mais o sistema. Quando cansou, resolveu então, não só trocar a velha janela, como por grades em todas elas.
Expedita, logo pela manhã - era por volta das 8h - recebia a visita de um estranho que lhe oferecera pela bagatela de R$ 15, um ventilador que miseravelmente valia R$ 40. ‘Chorou’ para ficar por R$ 10, mas quando viu a relutancia do vendedor, resolveu compra-lo e “sem nenhuma maldade”, a “coitadinha” encomendou-lhe outro o mais rápido possível. Ao tomar conhecimento que o objeto que acabara de comprar havia sido roubado e ela seria obrigada a devolve-lo, praguejou a justiça e gritou para os quatro cantos que pobre no Brasil não tinha vez.
Ednei vivia ocioso, havia muito tempo esperava um emprego. Vivia biscateando; um servicinho aqui, outro ali. Somente o suficiente para defender, quando dava, um mísero trocadinho para o cigarro, a pinga e o restinho para o jogo de cartas. Certo dia - “aleluia!” - chegara enfim, a vaga que tanto esperava. Era numa empreiteira que estava a construir um predio novo para a prefeitura local. Então, munido dos documentos que possuia, lá se foi  em busca do “emprego”. Registrado, começou a atuar como vigilante, aceitando sem muito boa vontade o dever de bater cartão todos os dias. Porém, no primeiro domingo em que fora escalado para o trabalho, não resistiu à esbórnia e “jogou pra cima”. Na segunda feira, o “pobre” do Ednei era mais uma vítima do desemprego nesse país. 
_Seu Renato achava que o imposto que pagava ao Estado lhe permitiria uma segurança plena, ao ponto de viver sem precisar gastar o seu precioso dinheiro com consertos de janelas e portas.
_Expedita cria de forma indubitável, que sua condição de pobre senhora carente lhe daria o direito de dar golpe nos golpistas.
_Ednei queria emprego, mas precisava da esbórnia para tocar a vida.

Êêêitha povo sofrido, meu Deus!


Jairo Cerqueira

sábado, 3 de abril de 2010

Qu(c)otidiano

                                         

Observando pessoas e coisas
Organizei meus pensamentos
É meio difícil achar essa trégua
Os homens parecem bichos
E os bichos assemelham-se às coisas
Quando os homens parecem bichos são coisas repugnantes
Quando os bichos parecem coisas viram peças na estante
E o que é o homem nesse instante?
Medíocre bicho pensante
Quanta celeuma da ciência para entender a raça humana
São apenas bichos que falam, são bestas que amam e enganam
Homens, bichos e coisas, história e filosofia...
Nada é pura verdade para o olho que desconfia
A tão venerada casta pensante
Sobrepõe-se aos outros seres e se vê dominadora
Não contentada com tão pouco  sobrepõe-se a si mesma 
Dentro do rol dos pensantes o irracionalismo divide, gerando a subtração
Nessa equação ordinária, a ciência se mantém viva, curiosa e eloqüente
Homens, bichos e coisas, história e filosofia...
Nada é pura verdade para o olho que desconfia


Texto escrito em Mar Grande – Ilha de Itaparica.



                               J a i r o   (2002)