quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Crônica suburbana





“A saideira e a conta”! O cidadão, ouvindo aquela voz baritonal, levanta-se e se dirige até o balcão para fazer a soma, enquanto termina a última partida de palitinho, ou porrinha, ou... qualquer porra, nessa maravilhosa metamorfose lingüística. Já passava das 16:45m, e na Avenida Suburbana nós só pensávamos em tomarmos o ferrie boaty das 17:30m, antes, porém, esperamos (contra a vontade das mulheres, claro!) pra ver quem ia perder a final. Perdeu Lula, o último a entrar no jogo. Abraços e despedidas e então, entramos no carro. Éramos cinco pessoas: dois casais e um pequeno questionador descendente dos Karamazov (Dimitri). De saída perguntei meio perdido: “Vamos ter mesmo que retornar isso tudo? A saída é ali perto”! Os olhos do velho Chico, conduzindo o veículo, voltaram-se para os meus, de uma forma tão paciente que pouparam a sua voz de me dizer que a tal saída era contra mão. Lá fomos nós em busca do retorno para depois, seguirmos em direção ao terminal de embarque. Durante o percurso nos deparamos com uma aglomeração típica de um sábado movimentado no tráfego urbano, ou pra ser mais preciso... Suburbano. Várias pessoas em volta de um cidadão que gemia apenas com o semblante pálido e desolado, sem sequer poder se contorcer. E os nossos olhares, dentro do carro, observavam aquela cena com dúvidas medíocres, mas pertinentes ao momento. “Parece que foi moto”! – “Deve ter sido atropelado enquanto pedalava em sua bicicleta”! – “Será que estava em água dura”?
Enquanto isso, um bêbado lerdo acenava com os olhos e as mãos bambas, aliás, o corpo todo bambo, ordenando que adiantássemos o nosso lado.
“Aqui é foda, vacilou dançou”! - Mais um lugar comum expressado na falta do que dizer.
“Meu vô, dirija devagar, vochê tomou cerveja”! - Entrou em ação o lúcido questionador, atingido indiretamente pela cena desagradável que tinha visto. “Você não confia em mim não é seu porra”? - Disse o velho Chico, um pouco impaciente, mas não menos atento ao trânsito. “Não”! - Respondeu baixinho o esperto e precavido Dimitri.
Enfim, retorno feito, pista razoavelmente acessível e, novamente passando próximo ao local do fato, ouvindo o barulho da sirene da SAMU (serviço de atendimento médico de urgência), vendo o engarrafamento que se alongava do outro lado da pista e também o corpo que agora já se contorcia no asfalto, o velho Chico faz o seguinte comentário: “Se a gente demora mais um pouquinho pra sair, olhe só onde a gente ainda ia estar. O ferrie de 17e30  ia pra casa do caralho”!
E todos nós, sem lembrarmos um só momento do corpo que estava ao chão, concordamos plenamente com ele.
Isso não é nenhum absurdo; faz parte da defecção humana.
Vida que segue!


Jairo Cerqueira (após um dia mesclado entre shopping Center e barzinho de beira de pista)

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