quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

A intertextualização do pagode

Em uma mesa de bar escutei uma batida instigantemente compassada, mas que trazia, para o meu desgosto, um refrão esdrúxulo que putrefazia toda aquela beleza rítmica. Era algo mais ou menos assim: “Boca de me dê, boca de me dá. Boca de me dê, boca de me dá”. Confesso que nem para dançar eu tive ânimo, porém, para minha surpresa, aproximava-se de mim e do colega ao lado, uma figuraça que tinha por característica principal, o hábito de contribuir para pagar a conta. Pensei:
_ Será coincidência, ou certos “poemas pagodais” evoluíram para o plano astrológico?
Desconsiderei a dúvida. Logo em seguida fui presenteado com a Banda Adão Negro e suas canções conspirando contra o Apartheid. Eu e o colega já liberávamos adrenalina com a liberdade de expressão corporal (Assim define o companheiro Jíder sobre o Regaae) e quase todo o bar já entrava em sintonias rítmica, discursiva e consumista. Até que alguém bradou fortemente: “Tira essa maresia daí! (na verdade ele disse mesmo foi – essa misera). Esse alguém, aparentemente irritadíssimo, era uma vítima indireta do Apartheid cantado pelo “Adão”. Ao visualizar o porte físico do questionador, ou seja, do agitador, o garçom nos olhou com uma cara que tinha uma “Boca de me dê” uma solução. Vendo o vexame do Bar Man (esse texto é globalisadíssimo) rapidamente o amigo plagiou Sine Calmon e disse em voz alta:
_ Ta liberado brotheeeeeeer!
Demos continuidade ao papo recheado com lúpulo e cevada e, entre uma garrafa e outra ouvimos “Mulher Brasileira,” cantada pelo Psirico, uma bela canção, que, aliás, ironicamente foi composta pelo mesmo sujeito que antes havia metralhado algumas pagodeiras, mas... faz parte.
Após esse momento diferenciado do pagode baiano, ouvimos uma música que pode ser considerada como a silabação da mediocridade musicada. É algo assim que tem que ser minuciosamente interpretado. Portanto, o produto final dependerá muito do seu perfil adquirido nas séries iniciais, é tipo assim:
_ “Eu disse Ma mas (não seria mais? – Ah, deixa pra lá.)conha. Cadê?”
_” Sa mais ci”... “Saci mais zêru”!
Assim que a melodia começou, não tive outro jeito senão parar de conversar para meditar sobre algo que me chamou atenção. Com trabalhar essa obra musical com adolescentes e pré-adolescentes sem fazer apologia, e consequentemente ser censurado. Veio-me rapidamente um tirocínio: eu poderia tomar como bibliografia o livro “O Sítio do Pica-pau amarelo” de Monteiro Lobato. Seria o bastante, pois: O saci entraria na parte de estudo de lendas, não mais como muito moleque e sim como “Mutcho dôdho”. A maconha poderia ser trabalhada como crime ambiental, afinal de contas ela é cortada, e queimada muitas vezes sob a luz solar (que é uma fonte natural de energia) ou, em antítese, ela poderia ser vista como remédio (droga). Quem sabe se a sua utilização não faria a Cuca ficar legal (boazinha) e de quebra ainda fizesse a cabeça da pobre mula.
De fato, penso que possa ser um show interdisciplinar.
Como já saí do plano etílico para o educativo, vou finalizar, expondo algo que me foi perguntado por um aluno aspirante ao Segundo Grau, logo após conversarmos bastante sobre a influencia de algumas letras de pagodes na formação do aluno universitário.
_ Você gostaria de ver suas filhas dançando “Rala a Theca no chão”. – perguntou ele cinicamente.
Respondi de imediato:
_ Preferia que fosse... “Desce com a mão no Tabaco”! Por entender que é algo mais higiênico e evitaria uma possível contaminação vaginal.

Jairo Cerqueira

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